No último dia 8 de março o Supremo Tribunal assentou por 7 votos a 4 pela constitucionalidade da penhora de bem de família de locador de contrato de locação.
A decisão é oriunda do RE 1.307.334 de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes. No voto, o Ministro defendeu a possibilidade da penhora arguindo:
“[..] não obstante a Lei 8.009/1990 preveja como regra a impenhorabilidade do bem de família, em nenhum momento impõe a sua inalienabilidade ou a impossibilidade transferir ou gravar de ônus real. Pelo contrário: mesmo tratando-se de bem de família, ao proprietário permanece o direito de usar, gozar e dispor de seu único imóvel. Destarte, o fiador, desde a celebração do contrato (seja de locação comercial ou residencial), já tem ciência de que todos os seus bens responderão pelo inadimplemento do locatário – inclusive seu bem de família, por expressa disposição do multicitado artigo 3°, VII, da Lei 8.009 /1990.”
A divergência do voto foi posteriormente inaugurada pelo Ministro Edson Fachin e seguida pelos ministros Lewandowski, Rosa Weber e Carmen Lúcia.
O entendimento final assentado pelo Tribunal traz luz aos debates referentes à impenhorabilidade do bem de família.
Bem de família, segundo a lei 8.009/1990, é a propriedade imóvel destinada a guarnecer o direito à moradia do casal ou da entidade familiar. Ele pode ser um bem legal, isto é, o único imóvel em que reside a família, ou convencional, ou seja, escolhido pela entidade familiar como bem de família mediante escritura pública.
O debate acerca da impenhorabilidade do bem de família versava, principalmente, sobre a possibilidade de restrição de imóvel enquanto bem legal.
De fato, a possível penhorabilidade do único imóvel de moradia da entidade familiar pode ensejar sério risco à proteção da moradia digna, impossibilitando a concretização do mínimo existencial.
Não obstante, o entendimento firmado pela Suprema Corte é que o fiador da locação goza daqueles direitos próprio do proprietário, a saber, o de gozar, fruir e dispor do bem.
Sendo assim, quando firma compromisso em contrato de locação ele está apenas a exercer, voluntariamente, os direitos oriundos da propriedade.
Não há que se falar, portanto, em violência ao mínimo existencial, vez que não se deduz por princípio que a disposição dos bens presume a desistência de direitos fundamentais.
A decisão, ademais, abre importante precedente para a consideração das posições de garantia, que alcançam não apenas o fiador de locação como também o avalista comercial.
O avalista, por meio do aval, dispõe de seus bens para a garantia do valor do contrato. Assim, voluntariamente, dispõe a universalidade dos seus bens, incluindo os de família, para garantir o avalizado.
Nesse contexto, percebe-se que a vontade do garantidor, quer do fiador quer do avalista, no momento da contratação, é o elemento mais relevante para sopesar a prevalência o princípio de incentivo à livre empresa em face do direito social à moradia.
A autorização do garantidor para dispor de seus bens é o pressuposto mais necessário e básico para afastar qualquer avilte ao direito de moradia, pois ele sinaliza às partes credora e devedora que seus bens trarão ao contrato todo o seu adimplemento e funcionalidade, incluindo o equilíbrio contratual e a adequação à função social do negócio jurídico.
A penhoralidade dos bens do fiador consolida assim o princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda) e trazem maior segurança jurídica às relações comerciais, que necessitam de um direito relativamente estável para se concretizarem.
Leandro Monteiro – OAB/PR 104.676.